“E assim começa. Com uma tempestade, um velho homem, sua família, um demônio… uma anciã indestrutível, espada encantada… e o Deus que a queria de volta”

God Country é um gibi publicado pela Image nos EUA, escrito por Donny Cates e desenhado por Geoff Shaw, que narra a história de um idoso com Alzheimer, a família, uma espada mágica e os donos da mesma. O cenário alterna entre o interior do Texas e um reino um tanto asgardiano (mas menos sábio e mais arrogante). Curti muito pela forma como a história é contada de forma ágil e por trazer algo fantástico para um mundo rotineiro.
O gibi mostra inicialmente uma família lidando com os sintomas do Alzheimer de Emmet Quinlan, que, em surto, teve que ser contido por policiais locais. E o clima local parece refletir a convulsão emocional sem freio do patriarca da família Quinlan. Assim, um tornado destrói a casa onde vivem. Do tornado, sai um demônio que corre atrás da neta de Emmet. O mesmo fenômeno climático trouxe a espada mágica Valofax, usada pelo patriarca para acabar com o demônio.

O demônio morre, o tornado se dissipa, assim como a doença mental de Emmet. O recordatório explica que enquanto ele tocar a Valofax, estará bem. Acho que esse foi um dos ganchos que me fez ler as seis edições de God Country. Além da luta bem contra o mal, temos uma relação familiar danificada e a fantasia como forma de lidar com isso. Isso lembra um pouco O Mágico de Oz (e sua busca junguiana) e Eu Mato Gigantes (um gibi bem bacana), este também da Image, e que deve sair esse mês nos cinemas dos EUA (aqui você vê o trailer). Não é segredo que a fantasia é usada como alegoria para os protagonistas aprenderem a lidar com problemas do “mundo real”.
Mais do que histórias fantásticas, estou curtindo muito histórias que trazem o fantástico para o nosso dia a dia e como elas se desenrolam. Talvez por isso tenha lido ler Deuses Americanos ou A Guerra do Velho. God Country se assemelha mais com o primeiro pelo combo EUA + Fantasia, mas enquanto Odin e afins atuam de forma sútil no livro do Neil Gaiman, no gibi do Donny Cates os deuses não se escondem e o poder exala. Também ando curtindo muito histórias passadas no interior, como Postal.
O quadrinista Donny Coates é do Texas e escolheu o estado como cenário de God Country por considerar o deserto como algo alienígena/místico: “Parece que essa parte do País é não mudou desde o início dos tempos. Parece indomada, selvagem e sobrenatural”. Acho que é o mesmo sentimento que levou Neil Gaiman a escrever Deuses Americanos. “Acho que a maior diferença entre Inglaterra e os EUA é que enquanto a Inglaterra tem história, os EUA têm geografia”, disse ele numa entrevista publicada no posfácio do ebook. É o que dizem no livro do Gaiman. Enquanto a Europa tem deuses, a América tem a terra sagrada e nela os deuses europeus não conseguem prosperar (ou algo assim).
O cenário é parte inexorável de God Country: a casa da família, o deserto e “Asgard”. É porque tradição, do Texas ou de “asgardiana”, é importante para a história. Elas correm em paralelo até se chocarem por conta de Valofax. E é assim que se começam as guerras, não é mesmo? Tradicionais, orgulhosos, os deuses querem a espada de volta. Emmet não quer devolve-la, pois isso significaria a volta do Alzheimer. E os dois mundos colidem.
Posso fazer várias leituras de God Country, mas prefiro que você leia e tire sua própria conclusão. O autor escreveu a história por conta de uma experiência pessoal (que ele não identificou) com doença na família. Então o Alzheimer tem bastante peso no contexto da história. Como o furacão, “Asgard”, o poder da doença mental é destrutivo e não permite diálogo. É possível ver que a cura da doença pela Valofax não resolve o problema de comunicação da família. Pelo menos não inicialmente.

Vou dizer que é um gibi sem muito nariz-de-cera (jargão jornalístico para enrolação), como muitos que vejo por aí, que enrolam o máximo pra introduzirem a trama na última página da primeira edição. Tem muita revista que quer fazer toda introdução e contextualiação antes de começar a história. É um saco. Os diálogos não são excessivos e as caracterizações são bem feitas, às vezes só com o uso de detalhes de desenhos.
O clímax é lindo, mas não vou postar aqui pra não estragar. A recomendação é: vão atrás que vale a pena.
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